quinta-feira, setembro 01, 2005

morrer vivo

Esta expressão perpassou-me o pensamento há algum tempo, depois de a ter ouvido aos meus lábios, num dia cinzento.

Lembrei-me, e esqueci-me do que me fez, na altura, pensar nisto. Hoje, apenas posso pensar no que sentirá quem pensa nisto, na primeira pessoa...

Que mentiroso que sou.

Esta angústia assalta-me praticamente todos os dias.

Apenas um pequeno pensamento, consola o espírito atormentado. Morrer vivo deverá ser como morrer na cama, durante um amor quente e fogoso (tenho claramente que escrever um post sobre o que acho disto, um dia). E assim, voltando ao assunto, morrer vivo, seria como abandonar o palco no auge da carreira da vida. Ao menos morria... quando estava vivo.

A preocupação que me assalta é um pouco mais asfixiante. E, se não chego a viver à séria, antes de morrer?
Quantas vezes vi nos outros o adiar de viver e estar e ser, com a desculpa insultuosa de que esta, menos interessante e desapaixonada e infeliz, seria uma parte necessária do caminho para um dia chegar a um qualquer estágio de nirvana.
Tolos. Estúpidos. Absolutos idiotas, os que esperam pelo inalcançável quando deveriam era tratar de ser felizes tão breve quanto pudessem.

Não se entenda a defesa do sofismo absoluto, enquanto forma de viver; afinal de contas, a busca do prazer tem que ser intercalada por qualquer coisa que, se não for pela alma, sirva, pelo menos, para descanso do corpo.

O pior é a perda da perspectiva, do objectivo ou objectivos a alcançar. Parece uma parvoíce, não é?
Se alguém perguntasse às gentes, e pedisse resposta imediata, sobre qual é o propósito da vida corrente e quais são as traduções práticas, materiais ou outras, desse propósito... nem quero pensar...

Arrisco que 96% não tinham resposta, 3,5% tinham, no máximo, uma ideia vaga e difusa do assunto, atirando para o ar uma ou duas ou três coisas que gostariam de fazer com a vida de que gozam mas, infelizmente, sem saber responder objectivamente à pergunta. Os restantes marginais, tinham resposta. Afinal de contas, privamos e dividimos a existência também com os loucos...

É dramático viver a pensar consciente ou a sentir em voz off. A realidade invade-nos os sentidos e a razão dispara à procura das causas e efeitos do ser que somos no mundo em que vivemos, rodeados por quem escolhemos e o acaso nos oferece.
E não pára de voar, a razão. E com a prática do tempo, traduz as contas e algoritmos da vida, que antes ocupavam espaço no consciente do dia a dia, em sentires e quereres e aromas que, mais tarde no tempo, se atiram para a frente dos olhos, quando precisamos de olhar, e dos neurónios, quando precisamos de pensar, e do nariz, quando precisamos de sentir.

E a vida passa num passo endiabrado, embalada nesta vertigem de ser. E preocupa...

Preocupa-me saber se um dia, quando morrer, alguma vez terei estado mesmo vivo.

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