segunda-feira, fevereiro 27, 2006

welcome back


revisitei-te como já não me recordava de ser capaz. esta música é a coisa mais linda do mundo, dá cabo de mim enquanto me mata de prazer.

gostava de ser capaz de publicar aqui todo o álbum para alguém que tivesse visto o filme e vivido a minha vida, pudesse sentir o que sinto.... é óbvio não é?...
ninguém sentirá. porque o viver é só, diferente.

curioso como o soar das cordas de um violino atiram para o presente aquela enxurrada de tanta coisa junta. hoje, relembro o tempo antigo. não a alma, nem o espírito, e não é porque os desgoste, apenas porque não me visitam já com a mesma frequência. mais feliz? talvez. pelo menos, de certeza, bem menos triste e mais satisfeito com o fado da vida. não que eu acredite na sorte ou no acaso fortuito de coisas que se unem num complot para nos fazer mais ou menos felizes. existe aleatoriedade, é certo. mas não existe só, e muito menos em maioria de votos. no entanto, a malvada da minoria do acaso é bem capaz de grandes levantamentos e revoluções armadas que, ainda que por momentos, tomam o poder e conduzem a vida da gente. enfim, o acaso existe, é forte mas está longe de ser tudo ou, sequer, predominante.
a vida corre agora ao sabor de menos loucura que há uns meses muito largos atrás. vivia e respirava de quase nada e engolia as lágrimas para ter água enquanto o sal me queimava as entranhas. consigo invocar os sentires que me assombraram com a mesma angústia daquele tempo. alucinado, fervia o fígado em lume brando enquanto ia destilando pela serpentina o álcool que não conseguia destruir. hoje tenho stolynshnaya em casa, para não matar ninguém a conduzir. mas não é a mesma coisa.
desgosta-nos o tempo em que era difícil o passar dos minutos, mas não há como, mais tarde, reinvocar com saudade e um certo masoquismo aquele aperto que torturava os minutos de luz e se soltava a correr pelos poros da pele. tenho também saudades do tempo sinistro e da vida errante e do vento que eu acompanhava para qualquer lado.
será sinal de pouca sanidade mental? talvez, mas o que me importa isso, se não me importa porra nenhuma do que alguma vez pensaram, ou podiam vir a pensar quem se cruzava com os meus olhos.
este ardor de viver é também vida e, acredito, é também um degrau de escada que cumpre passar. e voltar? bom voltar é como a atracção pelo abismo: não é recomendável, mas faz parte da natureza incerta de almas inquietas e loucas. a minha não pode ser certa.
no fundo, eu digo: ainda bem.
não gosto do ordinário e levantam-se-me as sobrancelhas intolerantes, sempre que me obrigam ou me obrigo a mim próprio. e convivo mal com este estar e deteste esse sentir.
talvez por isso reconheça a sabedoria de palavras que ouvi há dois ou três dias: actividades prazenteiras não despertam paixões. ah, pois não! JTD, que é como quem diz, Já Tinha Dito!!

o fogo de estar e ser alimenta-se de toros de madeira e tão mais forte quanto mais madeira, quer seja picada ou em bruto ou até uma escultura de valor incalculável, de um escultor de renome ou referência. não escolhe, alimenta-se e destrói.
o viver alimenta-se de nós todos os dias e espera que haja saber e vontade para lhe darem em bruto e de boa vontade. quando não tem, começa por nos queimar as esculturas que guardámos e, mais tarde, esgotada a arte, apaga-se e deixa instalar o frio de nada ou quase nada.

ontem, alimentaram o calor de viver com o freio nos dentes, enquanto espumava a raiva e a revolta. e ouvia-se bater o descompasso de um coração louco.
se deixarem só e inactivo o guerreiro que viveu a rachar ossos, a beber sangue, e contemplar com orgulho as feridas de refregas incontáveis, verão curvarem-se-lhe os ombros e morrerem os olhos nos buracos cavos de onde hoje, só podem lembrar o que foram as glórias, as derrotas e o tempo onde se guerreava por causas e haviam tantos castelos a levantar como a destruir.

Se o deixarem só, sem espada e sem batalhas, verão morrer novo o fogo que ardia no peito da batalha do meu viver. perde-se o olhar esgazeado para dar lugar à serenidade do tempo insonso. e depois, vivem de memórias. até das que fizeram sofrer mas, ao menos, lembram o tempo de estar vivo.

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Solidão perdida


E se, ao contrário do que tanta gente teme, a solidão, ou parte dela, for um bem a preservar?

Vivem e respiram todos juntos, esquecendo muitas vezes o significado da individualidade e da riqueza consequente. Se fosse uma massa anónima, sem picos de cordilheiras a despontar para o céu das ideias revolucionárias, não valia quase nada.
Somos muitos, porque sim. Com um propósito. E é suposto contribuir para a base comum de personalidade colectiva.
Contribuir! Não é igual a retirar ou usufruir. O outro já dizia: Não confunda: obra de arte de mestre Picasso, com pica de aço de mestre de obra. Não é a mesma coisa.

O chato, é que se assiste, quase em contínuo, à ânsia de agregação, pelas razões erradas. Vê-se a procura de status, vê-se a procura de companhia, de amizade, de carinho, de felicidade… a procura… a procura… a mim… para mim…
Quando fazem objecto de vida, o gregário e o comum, quase que arrisco dizer que, lá no fundo, está escondido e a tecer malhas, o sentimento parasita do fácil, do confortável e da comida pré-congelada. Já alguém fez. Vou aproveitar…
(bom, a comida pré-congelada é quase incontornável, eu sei…)

Colectivo, em sentido lato, podia ser entendido como pertença de todos. E o que é de todos, é suposto que todos tratem. Que todos alimentem. Ou afinal não.
Recusam-se a parar, e aprender, e extrapolar daí para coisas novas, ou quase, que possam depois oferecer. Aos outros. Contribuir.
E o que é que isto tem a ver com o princípio? É que aprender, pode ser em grupo, mas os momentos em deixamos assentar o que nos trouxeram de novo, têm que ser reservados. Todos podem fazer e deitar que matéria quiserem, cimento para o chão, tintas para uma parede ou barro numa escultura, mas aquilo que é construído por fora ou por dentro da gente, precisa de pousio. Para assentar e repousar, para a matéria agregar entre si e, mais importante, harmonizar com a base de sustento com quem deve ficar a ser um todo.
Este espaço tem que ser preservado, em horas ou minutos, em que estamos connosco. Sem os outros.

Depois, respiramos fundo, sorrimos, e vamos oferecer coisas novas a quem gostamos.

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

too soon, but not too late, either

às vezes não é porque se quer, apenas não há alternativa. mas muitas e tantas outras vezes deixamos embarcar nesta coisa de ser grande, gente pequena, antes do tempo certo.
se podem ser mães com 14 e menos, porque não poderiam ser homens há mais tempo que hoje?

não parece sequer justo, fazer as perguntas assim. mas a verdade é que o corpo esteve pronto há muito, e a natureza preparou com cuidado o que tinha que ter terminado antes de brigar por nós. e estivémos preparados há muito mais tempo do que arrancámos.
porque o corpo, esteve pronto há muito, não tivéssemos esquecido a cabeça da gente pequena.

com boas intenções, entenda-se, em muitos casos. mas de intenções,...
o facto é que pudémos em resposta e oposto de há muito tempo, estender o tempo de não ser nem decidir, e démo-lo às crianças. e, aparentemente, bem.
só nos deixámos embarcar na desresponsabilização e alheamento consecutivo e fomos deixando para mais tarde o que lhes era, só, devido. e muitas, não ouviram dar o tiro de partida.

esquecidas, viajaram para todas as direcções. não sabiam correr nem construir outros que não castelos de areia na praia. e foram sendo sopradas por aí ao desbarato.

foi-lhes roubada a agenda do tempo e hoje, não sabem que dia é. e faz-lhes falta.

for no reason

entrecortei o sono com os olhos abertos e as luzes desligadas por fora de mim.
um pouco mais tarde, serenou lentamente a inquietude do peso que fugiu à bruta.
e adormeci até de manhã.

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

nostalgia



Pensei há um tempo atrás -poucos dias- que a nostalgia acabaria por me atirar de volta e de encontro às letras.

No novo emprego, as coisas começam a acalmar e já consigo navegar à vista de terra.
Definitely I love new beginnings. Promessas novas e expectativas que renascem de cinzas onde as tínhamos enterrado. Uns e umas, mais do que outros e outras.

Não defendo, entenda-se que se possa viver só de recomeços. Nem tão pouco de continuidades indefinidas.

Num passeio que dei, lembrei-me das escadas, por exemplo.

Podem chegar aos armários mais altos de casa, e estas têm um no topo.
Podem subir para casa, e estas têm vários pelo caminho.
E temos as escadas para bombeiros e gente audaz, com prática e sentido destemido que não têm nenhum, a não ser a base de onde se lançam.

Não foi por acaso que se criaram patamares.

Não se sobe ininterruptamente sem parar para respirar. Até as escadas têm espaços para andarmos a direito um pouco antes de nos voltarmos a empurrar por mais degraus acima. Ninguém vive ininterruptamente a subir, e ninguém pode ficar parado nos patamares das escadas. Não há lá nada para fazer e não é, definitivamente, para isso que foram criados.

Temos que parar, mas não podemos ficar parados. De todo.

Uns poucos, artistas, sonham que podem atirar-se pelas escadas magirus de qualquer corporação de bombeiros, como se não houvesse amanhã.
Pelo caminho, apercebem-se que têm vertigens. É tarde.
E, ao chegar ao topo, percebem que, afinal, não está lá a revelação do sentido da vida. Gente estúpida; as escadas a pique são para percorrer ocasionalmente e, na maior parte das vezes, em defesa ou socorro de quem precise. Não são forma de estar, e o resultado comum é uma valentíssima queda e muitos ossos partidos.

Não se pode recomeçar em contínuo, porque não nasce viver, mas se pára, definha e apodrece com saudades do movimento.

E nos dias que nos esquecemos, ficamos mais pobres.