terça-feira, setembro 07, 2010

viajar é já ali ao lado - com aspas, se faz favor, para se perceber bem

disseram-me e depois explicaram-me, porque sentiram que seria necessário, pois concerteza.

«Não há felicidade para aquele que não viaja. Assim ouvimos dizer. Ao viver na sociedade dos homens, o melhor homem torna-se pecador. Vagueai, pois!... A sorte daquele que está sentado, senta-se; ergue-se quando ele se ergue; dorme quando ele dorme; move-se quando ele se move. Vagueai, pois!»

...estará escrito no livro «Onde os Rios têm Marés. Viagem pelo Norte do Paquistão e Estrada do Karakorum.» de Ana Isabel Mineiro.

fosse alguém feliz, se a capacidade que levanta as asas do pensar e do sentir, apesar do peso dos grilhões reais, fosse suficiente, se este viajar sem destino e sem roupa certa para ver, ouvir e cheirar o mundo, debaixo dos olhos de quem não olha para quem passa já ali ao lado, fosse a condição para se ser feliz.

é doce o pensamento mas ingénuo ou incompleto como tantos pensamentos doces.

que façamos nós quando mais ninguém, que se elevem os olhos onde não chegam, hoje, os braços. está certo e gosto muito.

mas, se as viagens que se fazem não são mais que a pequena ponta desse iceberg imenso que se traz preso dentro... dentro do que se lhe queira chamar a esta casca finita e suficiente que nos amarra aos dias.

nestas viagens em que se revisitam os lugares - pois não estive já cá antes?!... - relembram-se e confirmam ou desmentem-se os sorrisos e aromas com que povoamos o olhar, tantos anos antes de chegar sequer a pensar em ir. são velhos amigos com surpresas novas, com quem nos cruzamos lá longe, na terra deles.

talvez seja uma defesa do destino esta impossibilidade de viajar com a mesma frequência e velocidade com que os loucos levantam os pés do chão durante os dias e noites em que não dormem. 

Evita-se assim a sobrecarga de um qualquer sistema que não estivesse preparado para sonhar acordado, tantos anos seguidos.

não as trocava, as visitas que faço com o corpo, pelas que fiz antes, olhos fechados.

e são mais ricas e doces, por terem sido precedidas pelas outras.

mas não é, per si, um tempo feliz, o que se passa a "viajar"; apenas distante e salpicado pelos estilhaços do olhar que se parte de encontro às grades...

2 comentários:

Anónimo disse...

" Já lá estarei antes de chegar e ainda ficarei mesmo depois de ter partido..."

Maria Carvalhosa disse...

Só agora li. Gostei. Muito mais do que esperava gostar antes de o ter lido. É bom voltar a este teu lugar após uns meses de ausência!